
Ele avançou com o carro para a vaga, quase batendo no outro veículo que esperava havia uns três minutos, como a seta ligada, e, pelo retrovisor, viu a boca da motorista xingá-lo. Desligou o carro, pegou o celular e começou a ver um vídeo publicado num grupo de mensagens. Abriu a porta e sentiu o ar pesado, quente e sufocante. O shopping estava cheio para as compras de natal. Caminhou apressadamente em direção a entrada até desacelerar quando sentiu o ar fresco do interior. Encostou-se num canto de uma vitrine e reviu mais uma vez o vídeo, um trecho de uma entrevista do político que apoiava. Abriu a pequena lista de compras feita pela esposa, suspirou e mergulhou no fluxo de pessoas e sacolas, desviando delas com agilidade. Havia filas para tudo, e foi assim que se passaram quase duas horas, mesmo com sua rapidez para encontrar os presentes nas lojas.
— Boas festas, senhor!
— Feliz natal. Fe-liz na-tal! — respondeu para a jovem do caixa, na última loja.
Perto dali, próxima à praça de alimentação, uma agitação ao redor do presépio.
— Roubaram o menino Jesus! — disse uma senhora.
— Não respeitam mais o natal! — falou um senhor, gesticulando como o dedo indicador.
Então, colocou-se de costas para o presépio, esticou o braço, erguendo o celular diante do rosto e tirou uma foto de si com a manjedoura vazia ao fundo. Distanciou-se um pouco daquele alvoroço e publicou a foto com a legenda: “Não respeitam mais o Natal! Menino Jesus roubado dentro do Shopping! Onde está a segurança!?!!”.
— Já olharam as câmeras? — perguntou ao segurança.
— Estamos verificando.
— É isso o que acontece quando vocês deixam entrar todo tipo de gente aqui.
O celular vibrou em sua mão.
— Já fez as compras?
— Sim, já estou voltando.
— E o Davi? Acabei de ver a foto que você postou agora…
Uma onda de calor lhe subiu à cabeça, o coração disparou, sentiu uma forte náusea e uma leve vertigem.
— Alô, está me ouvindo?
— O senhor não pode deixar as sacolas aqui! — gritou o segurança.
Correu para a saída. Lá fora, o estacionamento lotado. Carros paravam diante das vagas ocupadas assim que avistavam alguém voltando com sacolas. Não havia uma nuvem, e o sol ardia. A chave deve ter caído quando correu pelos corredores, e então apenas batia na janela do passageiro, e chamava o filho. Todos estavam apressados. No início, ninguém percebeu nem ouviu nada, um homem gritando no deserto. Pois havia muito coisa para se fazer, afinal, era natal. Mas, depois um homem passou perto dele — que agora estava quieto e em choque, olhos vidrados — e, vendo o interior do carro, gritou: — Foi ele! Ele que roubou o menino Jesus, está lá dentro!
