Dois curtas

1.

Às vezes, pode ser assim: o verão traz a chuva, e eu visto suas tempestades, um vestido de noiva. Está escuro em Beirute. As ruas da cidade estão cheias, um cortejo fúnebre, os mortos nunca foram enterrados. Permaneço acordada. Ontem à noite, sonhei que eu sangrava e que você esfregava no meu corpo o sal raspado da superfície de Vênus. Comecei a brilhar e você me disse: “Pode ver? Tudo está melhor agora”. Espalho o resto do sal pelo mediterrâneo, observo o mar recuar, levando as coisas que amamos. Pode ver? Tudo está melhor agora. Precisávamos apenas devolver o nosso sal para a água.

Lara Atallah. https://bahrmagazine.com/tiger-balm-lara-atallah/


2.

Esta noite, o homem morrerá. De algum modo, a cidade já parece resignada, o crepúsculo plano de Beirute, fora do comum, nublado, uma imobilidade peculiar ondulando as árvores como vento. É fácil vestir a terra para a dor do luto, e esta noite os pássaros empoleirados nos emaranhados de fios de eletricidade parecem enlutados com suas penas pretas e brancas, sem canto, olhando para baixo, o concreto do campo de refugiados.

Opening lines of the novel The Arsonists’ City, by Hala Alyan.

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